segunda-feira, 26 de maio de 2008

Sem Essa Aranha


Ok, eu assumo. Ando em falta com o blog.

Na verdade, ultimamente, não sei bem o que postar, para o que direcionar...há vários filmes e livros sobre os quais gostaria de estar comentando, ao mesmo tempo que a minha necessidade de escrever grita. Talvez esteja poupando vocês da coisa errada...

Livros e filmes são muito mais interessantes do que qualquer delito imaginário cometido por mim, seja em relação a sociedade, a alegria, dores, amores e sabores...
Além do mais, a possibilidade de troca é maior, já que ninguém se atreve a cometer um delitinho sequer, nem que anonimamente...

("suas informações seriam mantidas no mais absoluto sigilo", rs)

Vamos lá então. Dentre os muuuitos filmes que já tinha listado em um papelzinho para comentar aqui, vou começar pelo último que assisti: "Sem Essa Aranha", dirigido por Rogério Sganzerla em 1970, uma cópia gravada do Canal Brasil...
(E, como sempre, mais uma vez, Canal Brasil salva a nação, apesar de cortar/editar uma cena de masturbação com uma garrafa de vidro)

Rogério Sganzerla. Cinema Marginal. Uma experiência.

Isso mesmo, ex-pe-ri-ên-cia.
Uma experiência difícil, corpórea. Parecia que via o filme com o corpo, com os músculos, lutando com meus frágeis neurônios para "entender" o que estava se passando...

As experiências acontecem num fluxo caótico.
Era muito pra minha cabecinha...

Imaginem...
De um lado, a busca forte por "sentidos" a que fomos condicionados mantinha meus olhos e minha mente excitados e ligados ao filme...
De outro lado, o quebra-cabeça abstrato e quase experimental que Sganzerla criou vinha para desmontar toda essa estrutura viciada que nos foi estipulada, criando uma contradição que me fazia indagar o porquê de estar tentando entender algo que, não necessariamente, precisava ser entendido...

Eu queria sentir e só.
Sentir a experiência que Sganzerla propôs...

Mas minha consciência não permitia...
O esforço intelectual me levou a inúmeras "crises de resistência"... (rsrs, ééé...quando não se tem o QI muito elevado, a mente brilhante e culturalmente ativa como muitos, a capacidade de dominar a consciência, a gente padece...)

Sabem aquelas pessoas que dormem em sessões de terapia?
Então, me senti igualzinho...rs
Ainda bem que não estava sozinha e, antes mesmo de cair no sono, era dispertada, mas tava difícil...(tb não vou dizer que não tive que voltar nenhuma cena, porque mentiria...)

A câmera é assumidamente tosca (aquela, sempre bem-vinda, ousadia da câmera na mão), o "boom" aparece em várias cenas, os planos-seqüências são longos e a interpretação dos atores parece que sai do útero, é contra tudo o que os teóricos já haviam definido...
...os personagens são desprovidos de construções psicológicas ou sociológicas, anti-naturalista e anti-realista, vivem o instante...

O filme exala brasilidade...
Uma honestidade que de tão verdadeira, tão próxima, assusta...
Um filme clandestino, um filme-grito, um filme-vômito, um filme urgente, um filme livre!!!

Acho que ninguém conseguiria assistir "Sem Essa Aranha" e não ficar intrigado com o filme, com as imagens, ou mesmo pensando em alguma possível mensagem subliminar que o diretor queria passar...

É um tipo de experiência perigosa para a normalidade...

...dessas que deixam as pessoas catatônicas...
...visceral demais para os que não se permitem...

"Números musicais com Moreira da Silva e Luiz Gonzaga, stripteases, um pacto com o demônio, artistas de circo, masturbação e morte completam essa eletrizante chanchada psicodélica, apresentada em quinze planos-seqüência de tirar o fôlego e enquadrados com estilo pela câmera-na-mão de Edson Santos." (Remier Lion)

É o grande sonho de fazer cinema, de viver cinema!!!



Algumas informações sobre o filme:

Sem Essa Aranha
(Brasil, 1970, P&B)
Gênero: Comédia
Duração: 102 min.
Produtora(s): Belair Filmes
Diretor/Roteirista: Rogério Sganzerla
Elenco: Aparecida, Moreira da Silva, Maria Gladys, Luiz Gonzaga, Helena Ignez, Jorge Loredo

"Em quinze planos-sequência delirantes, Sem Essa, Aranha, filmado pouco depois, traz o fim do mundo na pele de um pilantra; o caos de um país que está fora da página. É Jorge Loredo que faz Zé Bonitinho que faz Aranha, um cara de pau favelado casado com dezenas de mulheres e responsável pela alimentação de não sei quantas mil crianças. Três esposas são destacadas no filme: a raivosa personagem de Helena Ignez, a Aparecida domesticada e religiosa e uma insuportável Maria Gladys, que passa o filme inteiro berrando: "eu tô com fome!" e "ai que dor de barriga!".
É Sympathy For The Devil à moda carioca; o pecado exagerado via câmera na mão nos happenings tão profanos quanto psicodélicos.
Há três seqüências memoráveis. Um cabaré de quinta categoria, movido à música emocionadamente brega. Enquanto Helena Ignez força o vômito (depois ela aparece xingando todo o sistema solar!), Zé Bonitinho que faz Aranha que faz Jorge Loredo revela um strip-tease e proclama: "quando deus me fez, estava com complexo de superioridade".
Pouco depois, em um alegórico ensaio (?) de um grupo de circo, aparece tudo quanto é tipo de gente. Um homem cuspindo fogo, mulheres à beira de um colapso nervoso, um travesti negão encarnando o Exu e uma moça que morre engasgada com um sanduíche. Com o Brasil fora da página, pecar em dobro não é problema algum.
O ápice fica por conta de Aranha (Jorge Loredo que faz Zé Bonitinho) descendo o morro para jogar no bicho. Ele é cercado e desmascarado pelos favelados e por suas mulheres, que continuam berrando desesperadamente. Tudo acaba com Cristo sendo pisado ao som de forró. Há seis mil anos que era preciso aparecer um filme assim."

(Texto retirado de "Revista Virtual Freakium")

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